sábado, 6 de agosto de 2011

06 de Agosto de 2011

Antes eu costumava dizer: Ninguém consegue fazer poesia ao meio-dia. Eu estava errada, acontece muito de eu estar errada. Cada vez com mais frequência.
Eu estava errada porque existe poesia ao meio-dia, uma poesia áspera e borbulhante, uma poesia-lava, mormacenta e seca. O tempo pára ao meio-dia, ou melhor, anda em câmera lenta. Ao meio-dia, eu tenho a impressão de que o mundo vai acabar. Aliás, é o que eu penso, se o mundo acabar, será ao meio-dia.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Eu ainda estou aqui

Dê um pé na minha bunda!
Diga que me odeia!
Dê na minha cara!
Faça sangrar o meu orgulho, a minha dignidade, meu supercílio!
Aponte o dedo na minha cara, enfie o dedo no meu olho!
Seja mais explícito!
Meu coração é burro demais. Ainda não entendeu que não existe esperança para o nosso caso.
Meus pés não saberão ir embora enquanto você não disser com todas as letras e veias do pescoço que não me quer.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Relato de um sonho que tive com você

Eu vou. Vou porque sinto sua falta.
Sinto falta de estar com você na forma que aprendi a conhecê-lo. Porque sei que o único momento em que você não mente pra mim é quando goza.

(Diferente de você.)

Sim. Diferente de mim. Menti na cama, mas nunca fora dela.





(Está chorando?)

Sim.

(Por quê?)

Porque doeu.

(E por que você não disse, não pediu que eu parasse?)

Não quis estragar o momento. A última vez.

(A última?)

Sim. A última vez em que fazemos amor. Vou guardar meu corpo para alguém que seja livre. Que saiba ser livre e saiba não ser.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Metas

Eu metamorfo
mofo, não mais
capaz, rapaz
estando e não
estando e sim
e sim, estou aqui
aqui estou e vou
vou com você
onde vais?
fora daqui
fora lá
fora e não sou mais
em qualquer lugar.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Mergulho suave no mar das sensações

Eu sentei no alto do penhasco
E repousei meus olhos sobre o infinito
Permiti que minha alma saísse do corpo
Como poucos permitem ou sabem permitir
Planou por vários segundos sobre o rio
Tênue rio que cercava o vale
Meu coração, sempre rebelde
Retumbava, revoltante revoltado
Por outro lado, era isso que me fazia sentir ainda viva
Viva carne, viva alma
Com um olhar cheio de calma, forrei a paisagem
Minha alma, reinstalada, calou-se
Meu coração diminuiu sua marcha
Levantei-me grata a um Deus qualquer
Que me abraçou naquele instante.


quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Meias palavras e inteiras vontades

Abre teus braços pra mim, menino dos olhos cheios
Abre tua boca e abriga a carne dos meus anseios
Abre teus olhos febris de ódio e de desejo
Mas não deixe que num beijo
Seja escrito o nosso fim.

Não se cale desse jeito, não se feche em sua capa
Venha, me desenhe o mapa da tua alma inquieta
Aceito que não te entregues, que não queira meus carinhos
Mas nunca serás sozinho com minha porta sempre aberta

Que te sirva de alerta, menino de mil amores
Eu me importo é com teu mundo no meu mundo de sabores
Não me importa tuas cores nas telas de outras mulheres
O que importa é que eu te quero, é saber que tu me queres.


quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Para Dora

Será que um dia vou ver você crescer?
Será que um dia verei no teu rosto uma ruga que fará perceber que a juventude acabou e que não podemos mais brincar nas gangorras da vida?
Será que um dia você vai me aconselhar e dizer que alguma coisa nesse mundo é errada e que temos de ponderar?
Será?
Eu não anseio por esse dia, mas tenho curiosidade em saber se ele existirá.
Pois vejo em ti uma eterna menina, que carrega um mundo nas mãos pequeninas e faz bico quando o deixa cair.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Platônico

Tenho acrofobia, por isso não posso acompanhar você por entre as nuvens
Mas trago comigo meu binóculo
E te sigo, e consigo ver-te sorrindo
Ah, minhas tardes se passam leves
Eu, deitado na grama velha do meu quintal, te sigo até perder-te de vista
E então meu sorriso também se perde.
Eu me recolho, e espero.
Até ver-te de novo, voando sobre meu quintal.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Os brutos amam, mas não choram

Maria não chora.
Não chora por quê, Maria?
"Problemas no sistema nervoso."

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Análise de um amor imperfeito

Ontem eu trepei com Pedro. Como sempre, ele não me deu nada. Me disse que, semana passada tinha pensado em mim ao ver que eu havia esquecido uma liga de cabelo na mesa do computador. Não respondi nada. Às vezes fico me perguntando o que me leva a terminar tantas noites na cama de Pedro, e nunca consigo chegar a uma conclusão decente. Ou até chego, mas ela é vergonhosamente impublicável.
Pedro ri com os olhos. É a única coisa dele que ri. Nunca vi Pedro dar uma gargalhada. Seus dentes, nunca vi. Algum dentista da cidade deve ter conhecido. Se é que ele já foi em um algum dia. Não digo isso pelo estado estético, mas pela mania dele de achar que tudo tende a deterioração e é inevitável qualquer esforço.
Pedro é engraçado. Mas não engraçado de um jeito bom. Acho que só eu o acho engraçado do jeito que acho. Ele é um homem esculpido em rocha, ou seria em bosta? Não sei. Só sei que, independente de sua matéria-prima, terminarei na cama dele amanhã, se ele me ligar. Pensando bem, ele nunca me ligou. Ele nunca liga pra ninguém, nem pra nada. Nem pra mãe dele ele deve ligar. Se é que ele tem mãe. O coração de Pedro é de menino criado em orfanato.
Mas eu ligo. Eu sempre ligo. Ligo pra ele dizer que vai estar ocupado e que é melhor deixar para amanhã. Mas eu nunca deixo pra amanhã. Porque eu sei que hoje ele não está ocupado. Assim como eu estou muitíssimo, mas abandono tudo e vou até o apartamento de Pedro, pra encontrá-lo estirado no sofá, fumando maconha e olhando para o teto.
Não sei como Pedro entrou na minha vida. Essa ocasião virou um buraco na minha memória. É engraçado porque me pego pensando nisso, às vezes. É como se meu próprio corpo se esforçasse pra me poupar de um arrependimento pavoroso. Como se evitar passar por tal rua, numa certa hora me livrasse de um destino como esse: Essa vida com Pedro.
Todo Pedro merece ser amado, mas nenhuma mulher que ama um Pedro merece amá-lo. Concluo, na tentativa vã de me convencer a deixá-lo.

domingo, 2 de janeiro de 2011

E agora, Maria?

“Olha ali, olha, tá vendo ali? Ta vendo onde eles tão?”, ela me falou com lágrimas nos olhos, a boca, que guardava apenas um dente, tremia. Os cabelos grisalhos e crespos teimavam em fugir do coque, que outrora fora muito bem transado.

Miúda e magra. Uma Úrsula Buendía da minha realidade. Andando pela casa a reclamar da morte. “Que será de mim?” eis sua dúvida-mãe. Sofre por pavor ao sofrimento.

Angustiosamente me pergunto em que abismo profundo se refugiou minha vó. Em que caverna da mente? Será que anseia em voltar? Será que sua sanidade está presa num lugar cuja chave a loucura engoliu? Quem está insano, afinal?

Eu me encolho num canto do sofá, mastigando essas perguntas sem respostas. Enquanto ela anda pela casa pedindo que não a deixem só.